A Arte como Produto Coletivo

maio 01, 2019


Quando pensamos na arte enquanto profissionais desta e nos dedicamos tal qual, o pagamento – o valor do suor e do estudo e do tempo gasto para isso – se torna uma necessidade natural. No entanto, muitas vezes a procura ou expectativa desse pagamento nos distancia do nosso objetivo em fazer arte.

É comum ver o artista como um ser solitário, preso num instante de inspiração, numa busca enorme pela obra: pelo produto – para que esse possa ser visto, reconhecido, respeitado e validado, por vezes, é medido por seu valor financeiro.

Mas arte é mais que isso. Arte pode ser algo completamente inestimável, porque arte não é (só) o resultado, mas a experiência de fazê-la. Mais que isso, é importante lembrar que quando a obra artística atinge outro ela deixa de ser uma experiência só do artista pra ser algo assimilado e reinterpretado pelo público, tornando-se, assim, algo coletivo.

Ora, e não pode ser ela uma obra coletiva desde sua concepção, passando por sua feitura até sua apreciação? Não poderia ser a arte, na verdade, não o produto de algo, mas a vivência de muitos, juntos por um objetivo em comum, trocando conhecimentos, culturas, pensamentos e ideias para criar algo que é um amálgama de tudo isso e será apreciado por outros, mas que, principalmente, os uniu ali?

Nesses tempos em que vozes podem ser silenciadas, pessoas invisibilizadas, guilhotinas afiadas, acreditamos que poderia a arte ser mais que um produto a ser apreciado na sala como identificação de um status econômico, mas a aproximação de várias vozes, mentes e sentimentos vivendo a experiência de se conectar e compartilhar suas vidas umas com as outras e com o mundo. A arte pode ser mais que apreciação, ela pode ser reconhecimento e familiariadade, comunicação, humildade, compaixão e fraternidade.

O produto da arte é perecível. Ele pode ser destruído pelo tempo, consumido pelo fogo, levado pelo vento, inundado pelas chuvas – mas a experiência de sua concepção é eterna, é profunda, é universal e humana, porque a arte serve aos sentimentos e ao reconhecimento de nós mesmos e dos outros.

Assim, repetindo as palavras de Neil Gaiman e que nos serve de mote em muitas situações: (Hoje, mais do que nunca) Façamos boa arte (juntos).

– Texto de Luís Carlos Sousa. Tema proposto por Blenda Furtado. Inspirado no vídeo de Nora Atkinson

Publicado por Daniel Brandão

O Estúdio Daniel Brandão produz quadrinhos, ilustrações, criações de personagens e mascotes. Aqui também são oferecidos cursos de Desenho, HQ, Desenho Avançado e Mangá, além de aulas particulares.

História, Arte e Resistência

abril 24, 2019


Quando a Segunda Guerra Mundial estourou, Will Eisner já era um profissional de quadrinhos. Ele se alistou no exército, adaptando manuais militares para montagem e limpeza de armas, primeiros socorros e práticas de sobrevivência para oficiais de campo. Nesse trabalho, ele unia sua técnica de quadrinhos à linguagem instrutiva dos manuais, tornando-os mais fáceis de compreender e fazendo a diferença aos soldados à frente de batalha. Há um emocionante caso de um combatente que perdera um membro em guerra e, anos após o fim do conflito, este foi a uma convenção agradecer ao cartunista por seus manuais terem salvo sua vida. Importante lembrar que, apesar de americano, Eisner era judeu e fazer alguma diferença durante a guerra lhe motivava.

Quando os quadrinhos underground estavam em sua época mais efervescente, entre tantas vozes de outsiders falando sobre política e sociedade, uma artista em especial se destacava: Trina Robbins. Quadrinista, historiadora, jornalista, editora independente, feminista e ativista social, sendo responsável pelo considerado primeiro quadrinho com uma equipe inteiramente feminina: It Ain’t Me Babe Comix (e não o único na carreira da artista). Conhecida como a primeira mulher a desenhar a Mulher Maravilha, seu trabalho envolvia dar voz e espaço às mulheres artistas, falando sobre sexualidade, vivências, diferenças trabalhistas, aborto entre outros assuntos, muitas vezes sendo incisiva e direta com relação a assuntos vistos como “naturais” dentro de seu meio de atuação, como misoginia e machismo. Uma passagem em especial da vida de Robbins diz muito sobre seu lugar e voz como artista: quando o movimento dos Pantera Negras foi criminalizado e Angela Davis, uma das mais resistentes vozes do ativismo pelos direitos dos afro-americanos e do feminismo, foi perseguida, Trina confeccionou um pôster com a caricatura de Davis e a frase “Sister, You Are Welcome in This House” (irmã, você é bem-vinda nesta casa – em tradução livre), o qual foi afixado na casa de muitas mulheres que estavam prontas para dar refúgio à ativista.

Jackie Ormes é considerada a primeira cartunista afro-americana. Ela viveu de 1911 a 1985 e teve duas tiras de extremo sucesso: Torchy Brown e Patty-Jo ‘n’ Ginger. Ela viveu a efervescência do movimento de resistência afro-americano e suas tiras possuíam uma forte crítica social, de gênero e raça, mas recheadas com um humor envolvente e inteligente. Uma de suas grandes vitórias foi conseguir com que sua personagem Patty-Jo se tornasse uma boneca para crianças, obtendo enorme sucesso no Natal em que foi lançada, mas sendo descontinuada no ano seguinte. Hoje, a boneca é um valioso item de colecionador.

A arte é uma poderosa voz de resistência. Através da arte, faz-se história e inspira-se as novas gerações. Quando os monarcas de tempos sombrios ascendem, os artistas podem ser a voz do povo e levar gritos emudecidos a lugares que onde eles podem não somente ser ouvidos, mas replicados.

Façamos boa arte.

Publicado por Daniel Brandão

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