O Valor das Histórias em Quadrinhos Está em Si

dezembro 18, 2019


As histórias em quadrinhos são a minha forma de arte predileta. A linguagem que eu mais admiro. A mídia que mais consumo.

Os quadrinhos são uma forma de comunicação que não deve a nenhuma outra. O entrelaçamento de palavras e imagens justapostas numa narrativa geram uma linguagem própria, única e fascinante. Portanto, não há motivo algum para os quadrinhos sofrerem um complexo de inferioridade. Por isso, precisamos colocar alguns pontos nos “is”.

Não precisamos chamar os quadrinhos de ARTE SEQUENCIAL para se obter respeito. Arte sequencial é um ótimo termo cunhado pelo gênio Will Eisner e se tornou um excelente sinônimo para “quadrinhos”. Porém, se chamarmos esta forma de arte como HQ, Quadrinhos, Histórias em Quadrinhos, Banda Desenhada etc. ela não perde nenhum milímetro do seu valor.

Quadrinhos não é literatura! Não confunda. Na dúvida, pergunte o seguinte: literatura é quadrinhos? Claro que não. As duas linguagens possuem características próprias e não há nenhum tipo de hierarquia entre elas. Uma não é superior a outra. São diferentes e ambas têm um potencial ilimitado.

Quadrinhos não é gênero, é linguagem. Portanto, discordo de quem pensa que quadrinhos são um gênero literário. Assim como acho um absurdo reduzir os quadrinhos ao gênero de super-heróis ou ao gênero de humor… Todos os gêneros cabem em quadrinhos. Assim como o cinema, por exemplo, os quadrinhos podem contar histórias de todos os tipos para todos os públicos possíveis. Na linguagem dos quadrinhos, podem ter obras  extraordinariamente sofisticadas, como também podem ter resultados toscos.

As Histórias em Quadrinhos não são só para crianças. São também para crianças! Existem sim os quadrinhos infantis. Mas também existem histórias em quadrinhos para jovens, adultos, velhinhos etc. Podemos atingir todos os públicos com esta linguagem.

Fico irritado, portanto, quando a qualidade dos Quadrinhos são reduzidas à função de trampolim para a literatura ou para o que as pessoas consideram leituras “clássicas”. Isso pode acontecer sim e tudo bem. Muita gente começa lendo quadrinhos e em certo momento da vida migra para livros. Nada contra. Mas reduzir o valor dos quadrinhos a isso eu não concordo. O valor dos quadrinhos está em si. Existem muitos clássicos em quadrinhos. Há muita sofisticação, cultura e conhecimento dentro desta linguagem.

Não aconselho ninguém a ler só quadrinhos. Isso seria tão ruim quanto alguém que não lê nada e só assisti filmes. Seria pouco. Bom mesmo é ler quadrinhos, livros, assistir filmes, séries, documentários etc. Consumir arte e cultura de várias linguagens. Mas sem hierarquia entre elas. Sem complexos de inferioridade.

Até quem não gosta de quadrinhos os consome. Mesmo sem saber. Esta linguagem está entranhada em nosso dia a dia. Desde a pré-história. O ser humano seria incompleto sem as HQs. Precisamos respeitá-las.

Publicado por Daniel Brandão

O Estúdio Daniel Brandão produz quadrinhos, ilustrações, criações de personagens e mascotes. Aqui também são oferecidos cursos de Desenho, HQ, Desenho Avançado e Mangá, além de aulas particulares.

A Arte em Todas as Coisas

novembro 19, 2019


Scott McCloud, em seu livro Desvendando os Quadrinhos, define arte de uma forma muito ampla (e simples): “qualquer atividade humana que não se desenvolve a partir dos dois instintos básicos da nossa espécie: sobrevivência e reprodução”. Questionável de muitas formas – principalmente aos que contestam o quão espiritualmente “boa” deve ser a arte, o quanto esta pode ou deve estar ligada a sentimentos, sensações e intenções engrandecedoras – mas, ainda assim, reveladora.

Apoiando-se no argumento de McCloud – e desconsiderando temporariamente toda a complexidade das relações humanas -, se pararmos pra pensar, a arte é nosso fundamento enquanto seres sociais. Pois não nos cabe fazer somente a linha direta e objetiva de “sobrevivência e reprodução”. Queremos mais, desejamos mais, buscamos mais: tentamos nos expressar em nossas ações e emoções, percorremos as possibilidades no ínterim entre o belo e o grotesco para nos encontrar e agirmos de forma única, de forma artística.

Qualquer ação humana possui a assinatura da “artista” que a executou, seja ela realmente reconhecida pelo termo ou não. Desde as coisas grandiosas, como os detalhes dos salitres dos prédios, às cores das salas de cinema, à apresentação da refeição na hamburgueria favorita, até aqueles detalhes quase despercebidos de nossa rotina: o sorriso de bom dia da pessoa amada, as cócegas na barriga da criança, o afago carinhoso no bichinho de estimação, a troca de olhares silenciosa durante a dança, o beijinho-cheirinho cearense no encontro dos queridos… desejos de arte não reconhecidos, amorosamente escolhidos pelo coração que palpita, pelo calor que une, pelos gestos que aproximam.

Talvez, de forma ousada, devemos ressignificar a definição de McCloud: “qualquer atividade humana é arte”.

Texto de Luís Carlos Sousa

Publicado por Daniel Brandão

O Estúdio Daniel Brandão produz quadrinhos, ilustrações, criações de personagens e mascotes. Aqui também são oferecidos cursos de Desenho, HQ, Desenho Avançado e Mangá, além de aulas particulares.

O Bastante

novembro 12, 2019


Quanto tempo é o bastante para a arte ser considerada um trabalho? Para que o tempo que você gasta refazendo páginas e páginas de HQ ou os anos de estudo de teoria do design para melhor compor sua ilustração ou as várias noites de sábado em barzinhos inserindo suas próprias composições entre um ou outro cover da Marisa Monte ou as quase duas mil páginas de rascunhos de roteiros ou crônicas ou contos sejam consideradas a sua forma de viver, o seu ganha-pão?

A medida de tempo o bastante é… a utilidade.

Uma forma de arte é considerada trabalho no momento em que se torna útil: quando paga contas, quando gera empregos, quando mobiliza a sociedade. Ela é trabalho o bastante quando deixa de ser algo que se faz por prazer e se torna algo que cumpre requisitos, que fecha boletos, que garante status.

Mas seria isso mesmo?

À quadrinista, a arte se torna útil para ela quando a HQ traduz sentimentos de sua própria história. Ao ilustrador, ressignificar sua periferia em seu design arrojado que traduz suas raízes é ser útil. A música da cantora do barzinho encontra utilidade naquele instante em que conecta os enamorados que passaram a noite inteira se entreolhando. Ao escritor, em seu cárcere político, as ideias metamorfoseadas em mitos se tornam úteis à revolução social que se configura além de suas barras.

Todx artista sabe: a arte é útil por si, além de ganhos ou deméritos, pois salva aqueles que a fazem e aqueles que são tocados por ela.

A Arte é o bastante.

Texto de Luís Carlos Sousa

Publicado por Daniel Brandão

O Estúdio Daniel Brandão produz quadrinhos, ilustrações, criações de personagens e mascotes. Aqui também são oferecidos cursos de Desenho, HQ, Desenho Avançado e Mangá, além de aulas particulares.

Um Papo Sobre Editais

novembro 05, 2019


A palavra “edital” costuma ser vista, principalmente pela comunidade artística, como um símbolo de ansiedade e um verdadeiro entrave para a produção de arte em si. Minha intenção neste breve texto é tentar desmistificar isso (em 3 simples razões), trazendo uma visão mais social e política da importância dos editais e convidando os artistas que seguem essa newsletter (e mesmo outros além) a superarem um pouco a fobia de burocracia e apresentarem seus projetos às Secretarias e Instituições que os oferecem.

1. O dinheiro do edital é nosso: ao pagarmos impostos, o governo pega o montante recebido e reverte à sociedade em forma de segurança, saúde, educação, infraestrutura, mobilidade e… cultura! Dessa forma, o edital se torna um instrumento de convite à sociedade para se utilizar desses valores. Por vezes, eles abrem vagas em serviços (como os editais para cargos públicos) e em outros, principalmente ligados às artes, eles abrem para projetos – pois há uma compreensão (não irreal) de que a arte é contextualizada e focada no multiculturalismo geográfico (pense em quantos bairros há em Fortaleza, na quantidade diversa de vozes e culturas formando esse município, isso se multiplica quando pensamos em unidades da federação ou mesmo em nossa região) – assim, produtores culturais apresentam projetos que reforcem a identidade de suas comunidades e sirvam às mesmas, alimentando a cena de arte e tornando conhecidos quem são essas personas e como elas lidam com as mídias características de suas geografias e grupos;

2. A burocracia é bem menor do que se imagina: com o advento da lei da desburocratização, os complicados métodos para se entrar em um edital reduziram consideravelmente. Um exemplo em especial é o caso da Secult-CE, em que (quase) todo o processo é feito virtualmente antes, durante e depois. Além disso, a equipe envolvida costuma ser tão engajada com a cultura quanto os proponentes e entendem as complicações do cenário de arte em suas localidades. Caso a burocracia ainda seja um problema, hoje em dia existem muitas pessoas que trabalham como agentes culturais e cuidam de toda a papelada, além de instruírem bem quem quer se dedicar a um projeto.

3. Fazer arte é resistência: é inegável os tempos sombrios e incertos que vivemos. Criar arte em momentos assim é um ato de resistência, porque a arte impacta, cativa, “historifica”, marca e multiplica. Arte nos une e nos faz reconhecer, inspira e motiva. Assim, se utilizar de instrumentos que servem ao desenvolvimento, disseminação e aproximação da arte para com a sociedade deve ser feito, motivado e, principalmente, utilizado como voz para muitos.

Porque, no fim das contas a arte pode ser isso: um diapasão dos sentimentos e sensações de sua sociedade.

Texto de Luís Carlos Sousa.

Publicado por Daniel Brandão

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A Penosa Disputa

outubro 30, 2019


Os irmãos são cobertos pela nuvem de pó de magnésio, dando um ar idílico e mágico em torno deles. Os dois saltam nas barras, rodopiam no vazio, agarram-se e giram nas cordas, arremessando a si mesmos no ar. Pirueta e pouso. Ambos são aplaudidos, mas somente um se sente feliz pelo feito. O outro, por sua vez, percebe seus erros, revolta-se pelo acerto do irmão e não consegue ouvir os aplausos para si. A simples felicidade de seu fraterno oponente lhe é símbolo de derrota pessoal, imprecisão, incapacidade e falta de talento. Eles treinaram toda a vida juntos, tiveram as mesmas dietas, as mesmas rotinas, mas, por alguma razão, o primeiro irmão é melhor que o segundo – numa ordem construída pela frustração – e este, cada vez que percebe isso, se cobra mais, se exige mais, vai além dos próprios limites e só consegue perceber suas falhas. Para ele, o esporte deixou de ser um prazer para se tornar uma disputa, um esforço, um martírio.

Nós vivemos em disputas. Somos treinados a nos espelhar e compararmos uns com os outros, atentando para a vitória alheia como um conjunto de regras de um caminho bem pavimentado que refletem um “sucesso”, um “troféu”, não uma jornada. Quando não atingimos semelhantes objetivos, nossa frustração define culpados, cria demônios e nos coloca numa estrada com metas inatingíveis e fugazes.

No entanto, parece injusto nos impor exigências baseadas em outros. Nossas vidas e histórias são únicas, nossos tempos – aqueles além dos ponteiros e das medições matemáticas – seguem em seus próprios termos, falando através das “vozes” do corpo quando sentimos necessidade ou prazer por algo. Tomar a atenção para aquilo que o outro faz ou para o ponto que atinge é tapar os ouvidos pra si próprio, não ouvindo o que se precisa para se sentir bem e/ou como chegar a isso.

Há grandes disputas nas artes. Num perigoso e cruel jogo de vencedores e perdedores. Mas a arte não reconhece disputas. Ela não é uma arena de objetivos, mas uma escola de autoconhecimento. Ela não tem necessidades pois a arte é, assim como são todas as coisas naturais, tal qual as árvores de uma floresta ou os peixes de um rio: funcionando de suas próprias formas e nos seus próprios tempos para dar integridade a todo o sistema.

Aos que criam disputas, vendo-se correndo na direção dos “grandes” que inspiram: deem um tempo para si e olhem para suas próprias jornadas. Reconheçam e amem seus aprendizados. Sejam gratxs a eles. E se aceitem. Acima de todas as prerrogativas e “troféus”, todos somos artistas, pois todos temos a oportunidade de perceber e descobrir o melhor em nós mesmos.

Texto de Luís Carlos Sousa.

Publicado por Daniel Brandão

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